Quando eu me tornei Artista
Tudo parte no centro da cidade. Quando de noite me encarei no espelho e vi a cidade refletida sobre mim percebi que o natural das coisas no centro de tudo é a partida. Sinto-me como uma sala de espera, me entrego a todas as preocupações de vida: carreira, amigos, família, tudo passa e abandona, a natureza da vida é a morte. Vejo de longe as luzes que sentem falta de tudo que não é mais presente. Como já disseram a saudade é a fome de presença e a presença nada mais é que um momento preste a morrer.Tem cheiro de morte no centro da cidade, tem jeito de morte repetida, o abandono faz das ruas um monumento de descaso. Sentado na minha própria sala de espera me debruço sobre este exercício de perda. Perder é natural de vida.E no centro da cidade a perda é evidente no centro da questão, se as ruas são vazias no verão é por que a ausência preenche os prédios mortos de seus escritórios. O centro da cidade é trabalho e trabalho é ensaio de espera. Faz frio no verão, nada você pode saber disso, não vejo nada de engraçado no centro da cidade e isso me faz ficar pleno de uma coisa que se ausenta em um lugar qualquer, já que tudo na cidade é para ser usado e abandonado. Essa montanha russa de espera e morte faz da vida um precipício azul gostoso de se atirar. No apartamento essa adrenalina é evidente já que é onde o precipício aflora essa dor gostosa de vida.O mar de prédios, seguidos do entardecer, a lembrança nos ladrilhos claros de vida, a calçada.
Tomo o meu café, a nicotina me faz uma menina corajosa e malvada. Quero fazer um quadro gostoso de morrer no chão, quero fazer um quadro de ausência plena e que não deixe duvida para qualquer critico colocar em questão. A arte faz parte natural da perda, a arte é algo que só faz sentindo quando é deixado para a eternidade. O corpo da arte não aceita a morte. Por isso na arte qualquer um é imortal.Achei corajoso pintar um quadro de morte no centro da cidade em plena avenida São João.Tudo me permitia aquele ensaio de perda, só vi certeza em concretizar aquele momento de arte.Como seria bonito o sangue pintando asfalto, o asfalto pintando o meu rosto que pinta a morte que horroriza os pedestres que se eterniza na arte.Este momento vale minha sala de espera. A gilete desenhou na minha barriga: Agora sou um artista. E nessa certeza de arte me estamparam na primeira pagina do jornal de domingo com suspeita de suicídio, tolos nada eles entendem de arte moderna.
David Cejkinski 24/12/2007
sábado, 16 de maio de 2009
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Que lindo conto, amigo. Não tinha absorvido tamanha grandeza quando assisti desconcentrado na casa do Rô. Parabéns.
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